segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Noites Urbanas

Nas vagas ruas imundas, ruelas da vida d’outra espécie de gente, viam-se perdulários em jogatina, avaros nas sarjetas – não querendo dividir o resto do pão – e ébrios nas portas dos bares, não tão belos quanto Byron, não tão ricos quanto Gray, não tão nobres quanto Poe. Mas das resoluções mais que inoportunas o mesmo romantismo urbano das musicas populares, a mesma filosofia inóspita da monarquia inglesa e o mesmo santo presságio da tirania católica. Ah! E como pareciam as ruas romanas descritas por Azevedo.

Alvacenta, a luz da lua deformava sua imagem nas poças de álcool e vômito que os becos mantinham como poço artesiano. Os velhos, insanos, tarados, sonhavam com a pederastia em cada pedaço de jovem que na rua passava e a cada olhar temente, um gozo frêmito e cômico banhava o silêncio da noite com os urros orgíacos dos degredados.

Um homem passeava, vestia roupas comuns. Um simples trabalhador que voltava para casa, cansado da pressão da rotina, acostumado a sofrer os apertos na alma, os apertos na mente para não sofrê-los no sinto. Nem um homem dos becos se atreveria a provocá-lo, a sonhá-lo, a intervir-lhe em seu caminho, pois de que teme um homem que nasceu, cresceu e há de morrer no fracasso? Alardear sobre tal criatura é, no mínimo, insano e sangra mais que estanca.

Outro homem passou, roupas finas e macias. Sim! Este permitia sonhos, ainda jovem, forte, corado, como se fosse preparado para o coito. E os velhos dos becos uivavam e os bêbados, bígamos bissexuais, sentiam desejo e o desejo os dominava. Mas sonhar não subscreve crime e tocá-lo – homem de tão alta linha – trás mais prejuízos do que lucros, mais vergonhas, mais problemas do que prazer e o prazer provindo é jovem e mirrado em demasia para o saque valer a pena; e que pena horrendamente dolorosa.

Uma dama passa – se é que destas o mundo ainda guarda em seu cofre espesso – e os desejos se descontrolam, são superados os bloqueios da razão pelas vontades do ego e quando, quase no auge da loucura, homem poderoso demais a agarra e a aperta ao peito; e dos olhos de demônio todos os outros caem... Mil ao seu lado, dez mil a sua direita e nenhum a ele chegam.

E, por fim, antes do carro de Hélio ter força suficiente para, com sua tocha inumana, arrancar Nix da paz do seu reinado, passa alguém. Cabelos sob o boné, rosto jovial, roupas largas, tênis usados, calças lindamente batidas pelo tempo e pelo esforço da lavagem artesanal, um leve esboço melancólico de sorriso. Adeus! Não fico para observar... Adeus! A Deus! A deus! E que neste momento e somente neste momento ele exista.

Nenhum comentário:

Postar um comentário